Título:
Raízes do Repente: pesquisando as relações histórico-culturais entre a figura
do Rapsodo e os artistas de rua do Nordeste.
Resumo: Este
artigo pretende pesquisar se realmente há alguma ligação histórica ou cultural entre
o canto amebeu dos pastores da Grécia Antiga e o repente nordestino, bem como
entre a figura do Rapsodo e a do cantador de repente nordestino, através da
análise da obra de Luís da Câmara Cascudo, Vaqueiros e Cantadores, publicada em
1939. Pouco se sabe sobre a verdadeira origem dos estilos musicais
predominantes em algumas regiões do Brasil, como por exemplo, o repente na
região nordeste. Após a publicação deste livro, vamos encontrar várias
referências bibliográficas reiterando a afirmação de Cascudo. Mas Mário de
Andrade critica essa afirmação e sugere outra motivação para o desenvolvimento
do estilo musical do repente no Nordeste.
Palavras-chaves:
Rapsodo, Homero, Ilíada, amebeus, repente nordestino, Câmara Cascudo, Vaqueiros
e Cantadores, Mário de Andrade.
Abstract: This article aims to investigate whether there really is some historical or cultural connection between the amebeu style of singing common between the shepherds of ancient Greece and the Northeast's musical style “repente”, as well as between the figure of rhapsode and the northeastern repente’s singer (or “repentista) through the analysis of Luís da Câmara Cascudo’s book, “Vaqueiros e Cantadores”, published in 1939. Little is known about the true origin of the predominant musical styles in some regions of Brazil, for example, the northeast’s “repente”. After the publication of Cascudo's book, we will find many references reiterating his statements. However, Mário de Andrade criticizes this statement and suggests another motivation for the development of this musical style in the Northeast.
Abstract: This article aims to investigate whether there really is some historical or cultural connection between the amebeu style of singing common between the shepherds of ancient Greece and the Northeast's musical style “repente”, as well as between the figure of rhapsode and the northeastern repente’s singer (or “repentista) through the analysis of Luís da Câmara Cascudo’s book, “Vaqueiros e Cantadores”, published in 1939. Little is known about the true origin of the predominant musical styles in some regions of Brazil, for example, the northeast’s “repente”. After the publication of Cascudo's book, we will find many references reiterating his statements. However, Mário de Andrade criticizes this statement and suggests another motivation for the development of this musical style in the Northeast.
Keywords: Rhapsode,
Homer, Iliad, amebeus, Northeast’s Repente,
Câmara Cascudo, Vaqueiros e Cantadores, Mário de Andrade, .....
A tradição ibérica dos trovadores é encontrada na cultura
popular brasileira através de várias manifestações musicais, como por exemplo, a
trova gaúcha, o calango (Minas Gerais), o cururu (São Paulo), o sambe de roda
(Rio de Janeiro) e o repente nordestino. Assim como o trovador, os poetas
populares brasileiros iam “de região em região, com a viola nas costas, para cantar
seus versos”. Especificamente no caso do Repente, temos as primeiras
referências ao estilo na região Nordeste do Brasil em meados do século XIX,
mais precisamente na Paraíba. O nome Repente surge da característica dos versos
serem feitos de improviso, “de repente”, em um desafio com outro cantador. O repentista
nordestino podia ser encontrado em cidades e feiras cantando ou declamando
poesias, algumas vezes sozinho e em outras em duplas, quando então surgiam os
desafios entre os cantadores. “Não importa a beleza da voz ou a afinação – o que
vale é o ritmo e a agilidade mental que permita encurralar o oponente apenas
com a força do discurso”.
Devido à
ausência de documentação neste período e a característica de arte popular, não formalizada
e transmitida oralmente, pouco se sabe da origem real desses cantores, mas
sabe-se que antes mesmo do surgimento do repente, "cantadores anônimos
tenham perambulado Nordeste afora, ensaiando desafios, tocando viola e batendo
pandeiro".
Na busca das influências da desenvolvimento do repente, encontramos a pesquisa de Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) que vislumbra este elo inicial "no antigo canto amebeu grego (desafio entre pastores), cuja técnica teria sido adotada por Homero na Ilíada e na Odisséia.” (CASCUDO). “Oportuno lembrar que Homero viveu (se é que viveu) por volta dos séculos IX e VIII antes de Cristo. Assim, o canto amebeu grego já era exercitado há, pelo menos, trinta séculos de hoje. O mestre potiguar assinala que Horácio e Virgílio testemunharam a influência desse canto nas populações rurais de seu país". (LUCAS)
Em seu cordel A Origem do Repente, João Santana declama que:
Na Grécia Antiga viveram
Entes espetaculares,
Os rapsodos, que usavam
Declamações salutares
levando contos ao povo
Nos mais distantes lugares.
Depois deles, os aedos
Que em suas composições
Ao som das liras cantavam
As lendas e tradições,
Imortalizando histórias
Por diversas gerações."
A respeito de sua teoria, diz
Cascudo em seu livro Vaqueiros e Cantadores:
Na ‘cantoria’ não
há acompanhamento musical durante a solfa. Os instrumentos executam pequenos
trechos, antes e depois, do canto. São reminiscências dos prelúdios e
postlúdios com que os Rapsodos gregos desviavam a monotonia das longas
histórias cantadas? O trecho tocado é rápido e sempre em ritmo diverso do que
foi usado no canto. A disparidade estabelece um interesse maior, despertando
atenções e preparando o ambiente para a continuação. Essa música tem outra
finalidade. É o tempo-de-espera para o outro cantador armar os primeiros versos
da resposta improvisada. No desafio, no canto dos romances tradicionais, na
cantoria sertaneja enfim, não há acompanhamento durante a emissão da voz
humana. O canto amebeu dos pastores gregos, origem do desafio sertanejo, fora dessa
forma. A explicação é que tocavam flauta, sirinxs, instrumentos de sopro. Nenhum
pastor, de Teócrito ou dos idílios e oaristas gregos, aparece senão com a
flauta. Não há instrumento de corda. A harpa é posterior e pertenceu ao
rapsodo, às vezes cego e, compensativamente, de melhor e mais límpida memória.
Aos pastores do canto amebeu era impossível o acompanhamento, simultâneo com os
versos, uma vez que o instrumento era de sopro. Assim começara o canto
alternado... (CASCUDO, p. 142) (os grifos são do próprio Mário de Andrade no seu volume pessoal do livro. Ele também coloca uma interrogação ao final do parágrafo)
Numa
breve pesquisa sobre o assunto, encontramos vários sites e pesquisadores que
citam a tese de Cascudo sem questionar sua opinião. Mas encontramos um artigo
de Mário de Andrade, datado de 1940, que elogia o livro de Cascudo mas critica
a tese da origem do repente.
Da mesma forma
afirmar, com algum desperdício de erudição, que “o canto amebeu dos pastores
gregos (é a) origem do desafio” (pág. 142) me parece muito audaz e rápido. É
uma dessas afirmações absolutamente improváveis, tão criticamente inúteis como
a dos nossos folcloristas que ligam o Bumba-meu-Boi ao boi Ápis. Nesses
terrenos das afirmações
meramente associativas, chegaríamos a dizer que as brigas de palco, entre
cantoras, por exemplo, tiveram origem nas brigas instrumentais de Apolo. Por
que não considerar antes o desafio, tão instintivo, tão encontrável por esse
mundo fora, um desses “pensamentos elementares” que podem nascer,
independentemente de ligações, em vários pontos da terra? A meu ver, o ensaísta
norte-riograndense se prende com demasiado escrúpulo a essa tendência perigosa
de tudo ligar, através das geografias e das raças, esquecido de que, mais que
os movimentos migratórios, são a psicologia individual e as exigências sociais
que tornam o homem muito parecido consigo mesmo, seja ele pastor grego ou
pastor do sertão nordestino. (ANDRADE Apud DAMASCENO, p. 305)
Mário
de Andrade chama a atenção para a semelhança existente entre os vários tipos
humanos sobre a terra, sob os aspectos psicológico e social, para ele causa
mais provável da semelhança entre os estilos musicais.
(A DESENVOLVER)
BIBLIOGRAFIA:
http://www.infoescola.com/musica/repente/
http://culturapopularetc.blogspot.com.br/2010/01/origem-da-cantoria-nordestina.html
http://www.versoencantado.com.br/wp-content/uploads/2014/11/ecordel-a-origem-do-repente.pdf
SÁ, Marina Damasceno de. O
empalhador de passarinho, de Mário de Andrade: edição de texto fiel e anotado. Dissertação de Mestrado. USP, 2013
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